SINTÉTICO
Eu não sou um homem de verdade. Nunca fui. Espero nunca pensar ser.
Minha testosterona é injetável, sintética, e meus mamilos são tortos, irregulares, não parecem naturais, pois não são. Não foram feitos por Deus, nem pela natureza. Meu cirurgião, contudo, me deixou satisfeito. Minha namorada carinhosamente os chama de Frankenstein.
O que há de errado com o artificial? Já somos ciborgues há muito tempo.
Não há um corpo errado.
Não há um corpo biológico.
Não há um corpo de homem ou de mulher.
Há um corpo (?).
Há um corpo onde significados são escritos sobre ele, sem permissão, e com violência.
Não há uma alma masculina, um cérebro masculino ou uma essência masculina.
Minha vagina também não é uma vagina de homem, tampouco de mulher.
Não quero falar em identidades de gênero, não tenho ideia do que seja isso, estou mais interessado em desidentidades, no pós-gênero, no pós-humano.
Tenho um corpo nascido de teorias, soluções tópicas, seringas, bisturi, vídeos do YouTube e, claro, de delírios.
Tenho um corpo que só é possível por causa do cistema. Obrigado?
Tenho um corpo.